Tenho um plano, este jogo de mente
talvez esteja certo,
No sitio certo, há hora certa,
talvez hoje á noite,
e o sopro afaga a mão
e deixa o sinal.
Sair tarde beijar forte
e não esperar.

Tão tarde e de passagem
Debruça-se nela,
Melhores amigos, não designa
Talvez de fugida
Mas da fuga faz terror
e colidem-se no escuro.
Então, ela avança no frio dele
deixando-lhe o susto.

É apenas o susto, que deixa.
Que se vai embora.
É só como os outros.
Que se vai embora.
Ou então é o perigo e tu só não sabes.
Rezas para que vá, mas ele fique e cresce.

É mesmo só isto.


Todas as possibilidades que tentamos prever para a nossa vida ao longa da vida serão sempre vãs se as jogarmos de frente contra um qualquer, mas verdadeiro, final. É que não se trata de gostar de escrever sobre temas, como direi, negativos, como há dias me diziam.Não escrevo sobre o que me apetece tanto quanto na realidade gostava. Mas de uma forma até tanto mais feliz do que o tema em particular, ocorrem-me coisas. A todos ocorrem coisas, é verdade. Mas se fizer alguma diferença, eu acho que me ocorrem coisas que são muitas outras coisas. E passam-me frases curtas que transportam tudo o que já lá vem, mas que só depois descubro. Esta é a história do Albertino. O passeador de cordas, guilhotinado naquela tarde de sol pela outrora implacável natureza das naturezas mortas. Não só porque morreram, mas principalmente porque Adalberto as recorda ainda vivas.  Coloridas. Mas os vermelhos não são assim tão garridos como esses em que pensaste, nem existem árvores nesta história. Só mesmo duas salas. Uma vazia. Uma vazia com um roupeiro cheio de pó e um quadro. E Adalberto com as suas cordas entre as duas. Esta é a verdadeira história do rei que partiu, mas que não foi esquecido. Deixou para trás o que nunca deixou de se ouvir. Preferes que te desapareçam ou que te vão desvanecendo? 
À entrada para o excerto da gritaria enche-te de ar, estás aqui para ficar, e o Adalberto corda solta que sempre preferiu o azul ao preto, sabe que lhe pedem isto, mas que no final das contas pagará por aquilo. É sempre assim. Nem se sabe bem o que buscar, quando mais procurar onde. Ou nos cai na pauta, ou puta que os pariu, que isto é tudo muito bonito mas a mim, pessoalmente, já me cansa.
Cópias, clichés, papéis machés e outros tantos que tais. Palavras, e palavras, e palavras. E na imaginação, imagens e mais imagens. Tintas ou cordéis, traços ou pincéis. Rimas baratas de algibeira.
Ou se desaparece de uma vez, ou vai-se desaparecendo. Qual delas escolherá Adalberto, aberto a tudo, fechado outra vez?
Hoje em jeito de inicio de semana, capítulo derradeiro dos dois dias semanais que corrompem os trejeitos de um quotidiano demasiado adormecido nas novidades virtuais e nos imaginários despistados pelo trânsito matinal, gostaria de vos deixar com uma recordação comum: o dia em que choveram caveiras de pedra azul, e os druídas do Principe Real, então promovidos a barbudos andarilhos de estilo esbanjador, adormeceram num colchão de cabedal no meio da Praça de Espanha. Boa semana a todos.


Se o inicio do texto fosse "quando eu era pequeno" então estaria triste quando chove. Mas o que me chateava em pequeno continua a chatear-me, só que em doses diferentes e com nomes mais pomposos e descrições mais adjectivo bruto, agora. Desde cedo que me intrigou a minha relação com o chapéu-de-chuva até porque já habitualmente me diziam para parar de jogar á bola na sala, acabaria por mandar qualquer coisa ao chão sentenciando o momento. Dava trampa. 

 Mas a verdade é que o maldito chapéu-de-chuva atravessou toda a minha vida até hoje, ainda não a deixou, e manifesta-se com particular maquiavelismo. Não sou um confesso admirador das nuvens, sobretudo em situação de afogamento urbano. No campo a história é diferente, mas na cidade, pelo menos digna de vénia, a única situação que me ocorre em que chuva é um factor de determinante felicidade é no cliché domingueiro de ressaca e amor no sofá durante todo o dia, sendo que em alguns casos, como o meu, meia manhã de manha do gato normalmente chega-me para manter vivo o espirito chuvoso de janeiro. 

 Voltando á questão de ser criança e de chover, comecei a perder chapéus-de-chuva devia ter ai uns 10 anos. Não sei quantos chapéus de chuva já perdi. Mas confesso que já andei á chuva muitas vezes. Carruagens do metro, do comboio, autocarros, taxis, pastelarias, cafés e restaurantes, escritórios e ginásios, e até verdadeiramente em sitio nenhum eu já deixei um chapéu-de-chuva. 

 Não se trata apenas de me esquecer deles por todos esses lugares. É uma manifestação do meu espirito de comunidade. No caso dos comboios e do metro é claramente isso. Eu deixo os chapéus-de-chuva por ai espalhados para que alguém que não tenha um, mas que consiga chegar ali, molhado ou seco não interessa, possa prosseguir a sua viagem a partir dali protegido das intempéries que sobre ele se possam abrir. 

 Gostava muito de ter mais alguma coisa que escrever acerca deste assunto. Quem sabe até fechar este texto com um quinto parágrafo em jeito de moral conclusiva, ou de concretização de uma ideia importante. Mas não vai acontecer nada disso. Eu simplesmente só perco todos os chapéus-de-chuva que têm o azar de me cair na mão. Quanto a criar, então, um movimento global de permuta de chapéus-de-chuva pela cidade de forma casual e despropositada: talvez mais cinco parágrafos acrescentem tanto como estes últimos. Ou então que pare de chover de vez. Ou então que se foda, vou perder chapéus-de-chuva o resto da vida e permanentemente responder "…ah sim, o chapéu-de-chuva, estava para ai." É de se lhe tirar a gabardina.
Amar é viver o silêncio como o maior momento de felicidade. Por isso, levantem alto o som. Preciso de silêncio.

Na passagem de Joaquim.

Joaquim, é uma história. Dizia-lhe a mãe ao repousar-lhe a febril cabeça na mão. Os sonhos que te esventram o sono, encerram-me o coração, mas de nada servem estas palavras se não se te amarram as lágrimas afilhadas da má hora. Infinitas são as letras da sorte e imaginárias as palavras de azar. Circundaram-te no feto crioulo os transeuntes do horizonte e o fármaco único das montanhas de aprendiz, e tranquei eu as portadas da luz rarefeita com o espículo do toldar das noites e o tridente ferrugento de Onutpen o caçador. Infeliz e sem êxito.

Joaquim cresceu aos olhos da avó. Carambolas de flores e ramos de rosmaninho de prata. Ardósias do temporal construíram-se na vila Rural Magenta e percorreram-se os caminhos fechados dos pintores da escuridão. Também viveu felicidades em neve, branca branca, e navegou de uma só vez o sentimento na peregrina perdição da mulher que viajou do sul. Estudou as chuvas da solidão e a arquitectura secular dos habitantes da natureza, e dormiu nos pedregosos espruces coníferos da recém-habitada terra do gelo verde.

Amedrontem-se os que têm na luz do fundo do túnel o fim. Jô aqui, quer ver que corpo emite a luz, que dita o fim do túnel. Que choros se digladiam na noite atrás da luz, ou que luz alimenta o volume da ternura que encadeados, pela luz do túnel, não vemos.

Joaquim iletrado escreveu as maravilhas do retalho moderno, e verteu a sua primeira lágrima adulta no esborratar do rímel com a língua, no embaciar dos cílios eucariotas do rosto, e na narrativa do usurpador de batons com os dentes.

Equilatrem-se os muros do triângulo do tempo.Joaquim é uma história.

Prenuncio primeiro sobre a morte de Baltazar

Saía a cortina de fumo da água. Cerca da hora em que o dia passa o testemunho à sempre emancipada madrugada,e a figura cerrou-se em si. Ouvia-se a relva húmida da geada e cheirava no ar ao cântico sonolento da última estrela que não se avista da cidade. Bermudas meio justas, a destacar o joelho, de padrão miami praia. Um sol já escurecido e umas palmeiras, em meados da colecção primavera/verão, desgastadas já pelo vento que continuamente lhes raspava a pele.

O percurso do herói começou cedo, e isso concede-lhe que não liguemos á ausência de roupa no tronco. Alguns arranhões nas costas, e as bochechas vermelhas e inchadas. Talvez exista igualmente uma marca de luta por cima de um dos olhos que quase passava despercebida. Na edição primeira do manual do contador de histórias não era explicíto que tivessemos de o destacar e, em algumas casuais situações, o narrador confessa sentir-se perdido na linha da trama.

E assim se encontrava o nosso herói. Perdido. Preso num pedacinho de um momento, sem um mapa mestre que lhe indique a saída. O mesmo mapa que lhe faltou no inicio. Aquele mapa que não o empurrou para fora do mar que dele fez um naufrágo, que lhe afogou os sentidos, corrompendo-lhe a alma de imensidão e luz, e agora o pôs à mercê do julgamento sempre eterno dos pobres de espírito. Aqui não se ouvem trompetes, nem toca o requiem, nem uma única nota se ouve. Aqui não há mais luz, não há mais sombras nem nébulas. O cântico das sereias de afrodite chegou para lavar o que se tingiu no esgotamento. Os deslavados cardumes da ignorância levaram a melhor, porque pela carneirada do mundo o nosso herói se mostrou. Vidente e sábio, e agora assim.

Quando o narrador abraçou o púlpito não acompanhou a trama. Falou da história eterna que nunca deixa de ser contada. De como os seus narradores se permutam para manter em vida o que queima no conto. E cansado porque a voz o agoniava disse, ainda, que em cinco parárafos poderiamos correr todas as histórias, ou, se quiséssemos, contar a apenas a história do herói que ousou puxar o gatilho contra si no cair da cortina, e do público que aplaudíu de pé a aparição do nunca mais, com o vervor entusiasta de sempre.

A cortina de fumo emergente da água encerrou o acto único do capítulo de pedra. Os joelhos caídos no chão foram o último súspiro de uma alma que se afunda nas mais longínquas promiscuidades do nunca emancipado amanhecer. E quando os raios do sol tocaram o chão em sangue, evaporou-se a cortina de fumo, adormeceram-se os cânticos oscilantes de afrodite. O público trancou a sala onde agora repousa o silêncio, e o narrador tocou de uma só vez o ponto final na trama. Mas história eterna que nunca deixa de se contar não parou. Enquanto Baltazar dormia.

Nota solta para José e Maria revisitados.

Chama-se desespero consentido á quadrícula do sonho que lhe caíu do mosaico.
E o fumo do tabaco exageradamente áspero, aspira-lhe a densa barba do rosto, deixando-o só.
Não se trata de uma última palavra, caiu-se-lhe o fim do tempo aos pés e não mais foi possível a marcha lenta do eternamente.
Desamparados corações que vagueiam no mundo, em busca de um também palpitar comum entretanto perdido no tamborilante eclipse da tinta da china e do rasteiro pedal do tempo.

Ela desacreditou-o. Ele, sempre. Não mais.

Poderia o céu ter sido esse lugar terreno de um e de outro, quando um é outro no imenso singular que os dois são. Mas o pilar do rio é o leito, e os nenufares em peso morto transbordam o embrião hereditário destes dois cegos, que se sonharam nem futéis, nem tributáveis, nem de joelhos, quando a contra-dança das sensações é um pulsar resistente da salvação que ninguém quer.
O camuflado choro dos dias póstumos.

O estorvo que se pérpetua em cada narrativa a que ambos assistem do sofá. Onde se escondem e se sentem confortáveis, prontos para outra valsa da dormência consentida, que se inscreve em uma quadrícula mais do peregrino xadrez em que Rei e Rainha jamais se cruzarão de novo na casa partida.

Do fazedor de Cacimba.

El ciclope mecânico aprumando a poupa e afiando o cabedal rimou no espelho que se visse alguém de seu sangue cantaria ao desafio de navalha estilo oitentas, para lá de ganga e bigode, joelhos cruzantes, mãos trementes e olhares berrantes.

Que enquanto cruzante de pista lhe chamavam peregrino de Imaú, gritante da categórica euforia que sincroniza nos poro femininos a blasfémia constante do engate perfumado a flor de lis e magenta, sabe-se bem. Mas desconhecia-se desde há muito a investida do quadril em kizomba, a encarnação do fazedor de fotogramas na pictórica razão do viajante de xanata e cantante loud.

É sobe a dual constante nocturna de som/tensão que se constrói o seu jardim, que crescem os verdejantes e icónicos saberes em electrónica sintonia com o espaço viral. Sublinha: "Saber pensar não é uma arte rentável. Querer saber não é um desafio que por demais se ilustre. E quando se é os sinais que se cria, adormecemos no que fomos sendo ."

Em rima no espelho o aprumado ciclope da poupa de cabedal escreve no húmido "como se apenas nós os dois pudéssemos ver agora para repeti-lo quando quisermos". Dói-me. Sangra. E morri.

Mas passara pouco tempo desde o nascimento da virginal jovialidade, e os gritos ouviam-se em todo o iluminante despertar da Cacimba Rouge.